Alerta de gatilho.
Tô aqui para trazer um pouco de memórias do meu território, que é banhado pelo majestoso Rio Tapajós.
Sou Valdineia Sauré, também conhecida como Val Munduruku, tenho 25 anos, nascida e criada no Município do sudoeste paraense chamada de Jacareacanga, que em tupi quer dizer “Cabeça de Jacaré”. Os Antigos contam que é pelo fato do município, na época vila, ter a forma de uma cabeça grande de jacaré. Morei até os meus 17 anos, e ainda com 17 anos tive a oportunidade que poucos jovens da minha realidade não tiveram, ingressei na Universidade Federal do Oeste do Pará, pelo processo Seletivo Especial Indígena, na qual fui a primeira da minha família a entrar para o ensino superior, e me formar no ano de 2020 no curso de Gestão Pública e Desenvolvimento Regional.
A Universidade fica localizada na cidade de Santarém, distante a mais de 700 km do meu local de origem, foi a primeira vez que tive que morar fora do meu território e mesmo sem conhecer nada e ninguém vim na cara e na coragem, e agora é onde faço morada. O ingresso foi uma ótima oportunidade para transformar a minha realidade, e as dos meus, não foi fácil, mas sim eu consegui. A educação é um fator de transformação!!!
Meu município tem uma das maiores populações indígenas entre eles aldeados e não aldeados, apesar de não nascer em uma aldeia, sempre soube que era indígena e mesmo crescendo em um contexto urbano, não deixei de ter contatos com os meus parentes que vivem nas aldeias. Mas o que eu quero falar com isso? é que essa região de onde eu venho desde sempre teve sua principal atividade econômica gerada pelo garimpo, mesmo que de forma manual, (sim, é uma pena, falta muito incentivo), mas esse cenário começa a piorar quando devido a entrada de máquinas pesadas, tanto terrestre quanto aquáticas, na floresta, nos rios e nos territórios levando para o município muitas consequências e conflitos socioambientais, pois muita gente de fora se voltaram para localidade.
Eu só fui me dar conta da problemática quando comecei a participar dos movimentos sociais e no meu curso no ano de 2014 em Santarém, a Universidade me abriu os caminhos e me fez entender o quão grande e invasivo é essa atividade, que atinge não só o meio ambiente, mas também quem vive na região, como o meu povo que depende diretamente do território e do rio. Antes ameaçado por grandes hidrelétricas, o Rio Tapajós, que é casa dos encantados, agora vive uma grande tormenta que é causada pela ganância dos não indígenas que exploram a região, deixando para quem fica apenas a destruição e doenças.
Parte desse entendimento também só foi possível devido a várias formações que participei como a do engajamundo que contribui na formação de jovens em pautas relacionadas as mudanças climáticas, o que me fez engajar ainda mais, e hoje mesmo sendo criticada por ir contra o garimpo ilegal, por ter minha luta desconsiderada por muitos pelo simples fato de ser homossexual, me mantenho firme para somar na luta em defesa do território do meu povo, que vem sendo atacado e contaminado diariamente.
Quero continuar incentivando outros jovens a estarem nessa luta e principalmente a mudarem suas realidades assim como eu mudei a minha. E está fazendo parte de uma formação com a do MUVUCA e com outros jovens só me faz acreditar que não estamos sozinhos, que tem outras realidades que também se importam com a floresta em pé, e que entendem a importância da Amazônia para o restante do mundo.